Tio Zé enviuvou e andou meio só por algum tempo.
Um dia apareceu em casa e pediu prá levarmos ele até a casa de uns parentes distantes.
Na verdade distante era a casa dos parentes.
Fomos... entupido em um carro pequeno, num calor dos infernos sem saber direito onde ficava nosso destino... rodamos, rodamos muito e enfim paramos para pedir informação.
Perguntamos num lugar onde tinha muita gente, na verdade numa estação de trem em Caieiras, sei lá, tinha uma barraca que vendia uns biscoitos de polvilho e uma perigueti tinha morrido atropelada lá quando atravessou a rua prá comprar biscoito sem olhar para os lados.
Ninguém soube informar porra nenhuma e a atenção toda era prá perigueti que jazia estirada semi nua no chão, um horror.
Rodamos muito mais, um calor ensurdecedor e a gente já nem prá casa podia voltar porque não tínhamos mais a menor ideia de como fazer isso, enfim... fudidos, completamente.
Os pneus do carro já estavam moles quando o tio falou que aquele lugar parecia familiar.
Incrível estávamos diante de um prédio decadente onde havia um night club ordinário e certamente um puteiro em anexo, que catso de familiar seria?????
Mas não rodamos muito mais e o tio ganhou certeza, estávamos não só no caminho certo como muito próximos de nosso destino final.
A fome já comia o estomago, a sede fazia arder os dedos do pé.
O tio prá distrair a gente e ganhar uns créditos pela enrascada que nos metera ia contando umas lorotas, uma mais grossa que a outra... uma delas a de estar passeando de bicicleta e ter cruzado com uma garota de topless numa estrada deserta... coitado, não sabia andar de bicicleta, alias nem a pé ele andava direito, ele vivia ralado de tanto cambalear sóbrio e se arrebentar naqueles muros chapiscados de tijolo baiano./
Enfim ele reconheceu a rua, é esta, pode ter certeza esta é a Rua Campos floridos, pode subir. Já de cara vimos que a rua se chamava Amarildo Barbosa, mas o tio disse que a rua podia ter mudado de nome com o passar dos anos e que o Amarildo era um antigo morador do bairro. Chute, só chutava...
Avistou a casa de longe: - Aquela da árvore grande na frente, é uma casa amarelo canário... não era, a casa era um verde cítrico de fazer torcer o umbigo... mas mesmo assim ele nos fez parar em frente.
Ninguém queria descer do carro e tocar a campainha, até porque íamos precisar de ajuda prá sair, além de entalados havíamos contraído um epidemia de câimbras... diz que tava dando isso por lá. Resolvemos chamar o SAMU, prá ajudar, mas o tio saiu do carro foi abrindo o portão e chamando pelo povo da casa.
Apareceram umas pessoas muito estranhas com umas caras mais estranhas ainda. O tio perguntou se não se lembravam dele e o povo ficou mais mudo que gelatina de framboesa.
Descemos prá dar apoio ao tio e prá um eventual resgate caso o povo dali resolvesse cobrir ele de porrada, mas o clima mudou pela primeira vez quando nos viram saindo do carro todos tortos e mancos... acho que não imaginaram que podia caber mais 6 pessoas num Fiat 147... nos olharam como se fossemos um bando de anões de circo prontos prá entrar em cena.
Fomos entrando também e notamos que dois deles pegaram nos celulares, ou iam atirar eles na gente ou iam chamar a policia ou reforços... tinha um velho gordo com um cuecão que só coçava o queixo e um pivete cheio de píercings com cara de personagem de manga... mas a segunda virada veio neste preciso momento lá do fundo da varanda no grito rouco de uma velha que eu julgava estar morta e sentada numa cadeira de vime toda esbugalhada tipo ninho de garça. Ela gritou: - Artur quanta saudades.
O povo da casa olhou prá ela, olhou prô tio, olhou prá gente.
O tio Zé avançou, passou destemidamente pelo povo e foi lá abraçar a velha, lágrimas rolaram.
Depois de uma hora conversando abraçados, o tio já duro de ficar tanto tempo com as costas arqueadas a velha ralhou com o povo prá eles terem mais educação e convidarem a gente prá entrar.
Imaginávamos ao sair de casa uma festa com churrasco e ainda nem mijar podíamos.
Entramos por um corredor polonês enquanto a vizinhança toda nos observava, nunca havia sentido a morte tão próxima de mim assim, deu prá sentir o bafo do cotovelo.
A sala era uma coisa deplorável... escura, móveis escuros, uma televisão de marca Invictus de caixote num canto, umas cortinas grossas e negras e umas cadeiras de jacaranda com uns estofados mijados de gato, úmidos e grudentos. Tivemos que sentar em 3 em cada cadeira, uma quininha de bunda para cada um.
Eramos observados tipo aquela cena da Branca de Neve no bosque, só víamos o branco dos olhos de um numero infinito de criaturas... a tv chiava, e o tio e a velha prá nosso desespero não entraram na sala e ficaram lá fora conversando. Uma hora no portão e mais uma hora e meia naquela caverna do dragão e nem uma palavra... um silêncio mortal, só o chiado da tv, o cheiro de mijo de gato e as trevas...
Eu pensava um plano para nos colocar fora dali, nada me ocorria, nisso alguém passou e fechou a porta que dava para a varanda e nossa unica rota de fuga... breu, breu total, nem a corrida de arroz da tv conseguia clarear nada... agora vamos morrer, eles vão nos esfaquear e enterrar os corpos...
Meu primo Eugênio pediu prá ir ao banheiro... caralho, como ele teve a ousadia de abrir a boca... em troca ouvimos: - Claro coração, venha comigo...
Alguém pegou o primo pela mão e o levou.
Acho que se passaram algumas horas e ele não voltava...
E o almoço, a que horas vão acender a churrasqueira? Quando vão liberar a cerveja gelada?
Alguém passou correndo por mim e me deu um baita esbarrão, era um par de peitos, peitos durinhos, peitos de uma adolescente... - Oi primo...
- OOOi, quero dizer oi...
Mas ela correu e se foi, minha unica oportunidade de salvação se fora, minha única amiga nesta face da terra se foi.
Escureceu, sim o que já era escuro escureceu e o tio entrou e disse:
- Então, eu sei que a conversa de vocês esta boa mas acho que esta na hora de irmos...
Porra, nem um cafezinho, nem a oferta de um cafezinho...
Ninguém pensou duas vezes, tateamos no escuro e fomos apertando as mãos de que encontrávamos e dizíamos: - Foi um prazer, foi um prazer, foi um prazer... alguns anos depois dessa experiência tentamos lembrar quantas mãos havíamos apertado cada um e concluímos que ou nós ficamos meia hora apertando nossas próprias mãos ou eram muitos mesmo do lado deles pois cada um acredita ter apertado a mão de pelo menos umas 40 pessoas, mas pode ter sido 10, ou 5, sei lá.
Saímos para a varanda e o Fiat estava estacionado no mesmo lugar mas virado no sentido oposto que deixamos, descobrimos que o rádio, o estepe, a capa do volante e uma imagem de Raquel Welch haviam sumido, depois notamos que o combustível também, mas pode ser que não, havíamos andado muito.
Lotamos o carro, os estômagos roncavam mas tínhamos uma estranha sensação de alívio e conforto, até parecia que o carro tinha ficado maior.
A velha acenou um adeus e gritou: Volte sempre Artur, volte sempre Orlando... Orlando? Ela sabia o meu nome... mas quem seria Artur?
O tio Zé disse prá gente não ligar que ela estava caduca e errava o nome dele o tempo todo.
Acenamos, o povo mal encarado e frio acenou também e o velho de cuecão só coçava o queixo.
Um puta transito na volta, colocamos uma gasolina ordinária prá completar o tanque e o carro voltou pipocando e morrendo o tempo todo... fomos parados pela polícia e não tínhamos os documentos em ordem, juntamos uns 46 paus e subornamos o guarda, um cara meio afeminado que dizia que não gostava de fazer aquilo, que só fazia prá aliviar o lado da gente... 4 horas depois estávamos em casa moídos e sem a mínima condição de encarar uma segunda feira de trabalho, onze e meia da noite... mas cadê o Eugênio?
Perdemos o Eugênio e a Raquel Welch numa só noite.
Um dia apareceu em casa e pediu prá levarmos ele até a casa de uns parentes distantes.
Na verdade distante era a casa dos parentes.
Fomos... entupido em um carro pequeno, num calor dos infernos sem saber direito onde ficava nosso destino... rodamos, rodamos muito e enfim paramos para pedir informação.
Perguntamos num lugar onde tinha muita gente, na verdade numa estação de trem em Caieiras, sei lá, tinha uma barraca que vendia uns biscoitos de polvilho e uma perigueti tinha morrido atropelada lá quando atravessou a rua prá comprar biscoito sem olhar para os lados.
Ninguém soube informar porra nenhuma e a atenção toda era prá perigueti que jazia estirada semi nua no chão, um horror.
Rodamos muito mais, um calor ensurdecedor e a gente já nem prá casa podia voltar porque não tínhamos mais a menor ideia de como fazer isso, enfim... fudidos, completamente.
Os pneus do carro já estavam moles quando o tio falou que aquele lugar parecia familiar.
Incrível estávamos diante de um prédio decadente onde havia um night club ordinário e certamente um puteiro em anexo, que catso de familiar seria?????
Mas não rodamos muito mais e o tio ganhou certeza, estávamos não só no caminho certo como muito próximos de nosso destino final.
A fome já comia o estomago, a sede fazia arder os dedos do pé.
O tio prá distrair a gente e ganhar uns créditos pela enrascada que nos metera ia contando umas lorotas, uma mais grossa que a outra... uma delas a de estar passeando de bicicleta e ter cruzado com uma garota de topless numa estrada deserta... coitado, não sabia andar de bicicleta, alias nem a pé ele andava direito, ele vivia ralado de tanto cambalear sóbrio e se arrebentar naqueles muros chapiscados de tijolo baiano./
Enfim ele reconheceu a rua, é esta, pode ter certeza esta é a Rua Campos floridos, pode subir. Já de cara vimos que a rua se chamava Amarildo Barbosa, mas o tio disse que a rua podia ter mudado de nome com o passar dos anos e que o Amarildo era um antigo morador do bairro. Chute, só chutava...
Avistou a casa de longe: - Aquela da árvore grande na frente, é uma casa amarelo canário... não era, a casa era um verde cítrico de fazer torcer o umbigo... mas mesmo assim ele nos fez parar em frente.
Ninguém queria descer do carro e tocar a campainha, até porque íamos precisar de ajuda prá sair, além de entalados havíamos contraído um epidemia de câimbras... diz que tava dando isso por lá. Resolvemos chamar o SAMU, prá ajudar, mas o tio saiu do carro foi abrindo o portão e chamando pelo povo da casa.
Apareceram umas pessoas muito estranhas com umas caras mais estranhas ainda. O tio perguntou se não se lembravam dele e o povo ficou mais mudo que gelatina de framboesa.
Descemos prá dar apoio ao tio e prá um eventual resgate caso o povo dali resolvesse cobrir ele de porrada, mas o clima mudou pela primeira vez quando nos viram saindo do carro todos tortos e mancos... acho que não imaginaram que podia caber mais 6 pessoas num Fiat 147... nos olharam como se fossemos um bando de anões de circo prontos prá entrar em cena.
Fomos entrando também e notamos que dois deles pegaram nos celulares, ou iam atirar eles na gente ou iam chamar a policia ou reforços... tinha um velho gordo com um cuecão que só coçava o queixo e um pivete cheio de píercings com cara de personagem de manga... mas a segunda virada veio neste preciso momento lá do fundo da varanda no grito rouco de uma velha que eu julgava estar morta e sentada numa cadeira de vime toda esbugalhada tipo ninho de garça. Ela gritou: - Artur quanta saudades.
O povo da casa olhou prá ela, olhou prô tio, olhou prá gente.
O tio Zé avançou, passou destemidamente pelo povo e foi lá abraçar a velha, lágrimas rolaram.
Depois de uma hora conversando abraçados, o tio já duro de ficar tanto tempo com as costas arqueadas a velha ralhou com o povo prá eles terem mais educação e convidarem a gente prá entrar.
Imaginávamos ao sair de casa uma festa com churrasco e ainda nem mijar podíamos.
Entramos por um corredor polonês enquanto a vizinhança toda nos observava, nunca havia sentido a morte tão próxima de mim assim, deu prá sentir o bafo do cotovelo.
A sala era uma coisa deplorável... escura, móveis escuros, uma televisão de marca Invictus de caixote num canto, umas cortinas grossas e negras e umas cadeiras de jacaranda com uns estofados mijados de gato, úmidos e grudentos. Tivemos que sentar em 3 em cada cadeira, uma quininha de bunda para cada um.
Eramos observados tipo aquela cena da Branca de Neve no bosque, só víamos o branco dos olhos de um numero infinito de criaturas... a tv chiava, e o tio e a velha prá nosso desespero não entraram na sala e ficaram lá fora conversando. Uma hora no portão e mais uma hora e meia naquela caverna do dragão e nem uma palavra... um silêncio mortal, só o chiado da tv, o cheiro de mijo de gato e as trevas...
Eu pensava um plano para nos colocar fora dali, nada me ocorria, nisso alguém passou e fechou a porta que dava para a varanda e nossa unica rota de fuga... breu, breu total, nem a corrida de arroz da tv conseguia clarear nada... agora vamos morrer, eles vão nos esfaquear e enterrar os corpos...
Meu primo Eugênio pediu prá ir ao banheiro... caralho, como ele teve a ousadia de abrir a boca... em troca ouvimos: - Claro coração, venha comigo...
Alguém pegou o primo pela mão e o levou.
Acho que se passaram algumas horas e ele não voltava...
E o almoço, a que horas vão acender a churrasqueira? Quando vão liberar a cerveja gelada?
Alguém passou correndo por mim e me deu um baita esbarrão, era um par de peitos, peitos durinhos, peitos de uma adolescente... - Oi primo...
- OOOi, quero dizer oi...
Mas ela correu e se foi, minha unica oportunidade de salvação se fora, minha única amiga nesta face da terra se foi.
Escureceu, sim o que já era escuro escureceu e o tio entrou e disse:
- Então, eu sei que a conversa de vocês esta boa mas acho que esta na hora de irmos...
Porra, nem um cafezinho, nem a oferta de um cafezinho...
Ninguém pensou duas vezes, tateamos no escuro e fomos apertando as mãos de que encontrávamos e dizíamos: - Foi um prazer, foi um prazer, foi um prazer... alguns anos depois dessa experiência tentamos lembrar quantas mãos havíamos apertado cada um e concluímos que ou nós ficamos meia hora apertando nossas próprias mãos ou eram muitos mesmo do lado deles pois cada um acredita ter apertado a mão de pelo menos umas 40 pessoas, mas pode ter sido 10, ou 5, sei lá.
Saímos para a varanda e o Fiat estava estacionado no mesmo lugar mas virado no sentido oposto que deixamos, descobrimos que o rádio, o estepe, a capa do volante e uma imagem de Raquel Welch haviam sumido, depois notamos que o combustível também, mas pode ser que não, havíamos andado muito.
Lotamos o carro, os estômagos roncavam mas tínhamos uma estranha sensação de alívio e conforto, até parecia que o carro tinha ficado maior.
A velha acenou um adeus e gritou: Volte sempre Artur, volte sempre Orlando... Orlando? Ela sabia o meu nome... mas quem seria Artur?
O tio Zé disse prá gente não ligar que ela estava caduca e errava o nome dele o tempo todo.
Acenamos, o povo mal encarado e frio acenou também e o velho de cuecão só coçava o queixo.
Um puta transito na volta, colocamos uma gasolina ordinária prá completar o tanque e o carro voltou pipocando e morrendo o tempo todo... fomos parados pela polícia e não tínhamos os documentos em ordem, juntamos uns 46 paus e subornamos o guarda, um cara meio afeminado que dizia que não gostava de fazer aquilo, que só fazia prá aliviar o lado da gente... 4 horas depois estávamos em casa moídos e sem a mínima condição de encarar uma segunda feira de trabalho, onze e meia da noite... mas cadê o Eugênio?
Perdemos o Eugênio e a Raquel Welch numa só noite.
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